segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Felisciano

Atordoado como se tivesse acordado a pouco. Olhos ainda desfocados. Boca seca. Braço dormente. Esfrego as costas da mão nos olhos, começo a entender que ainda estou no mesmo lugar. A poltrona ali vazia. Ainda espero, olho a sala oval, olho o tapete no centro e apenas estas duas cadeiras, e uma mesa de apoio. Nesta, a única coisa que existe sobre, é uma garrafa de bebida maltada. Dois copos. Um pequeno balde de gelo.

Escuto risadas do lado de fora. Cada vez mais altas. Passos. Ele se aproxima. Entra. Alto, um homem de meia idade, bonito, muito elegante. Paletó negro, blusa branca, gravata vermelha. Muito alinhado como um manequim. Roupa esticada como uma perfeição duvidosa. Cabelos bem cortados, penteados minuciosamente para o lado direito. Alguns fios grisalho acima da orelha  dão o charme e o ar de interessante. Homem que sabe o que diz.

Ao chegar perto, não gargalha mais. Fecha o rosto. Se aproxima sem cumprimentar. Senta-se, serve uma dose para ele e para mim. Não pergunta, ao menos, se aceito. Apenas me entrega o copo. Levanto o copo à altura do meu rosto, em sinal de quem brinda.

Ele não faz nada. Vira a dose inteira de um gole e fica a me olhar, esperando as perguntas. Mas eu travo. Perco os papéis. Mãos trêmulas. Frio na barriga. Borboletas no estômago? Talvez não. Nervosismo. Estou com medo.

Não é medo dele. Do que ele possa me fazer. Mas eu nunca o tinha visto tão de perto. Era algo impensável. Surreal, e na verdade ele está aqui. Frente a mim. Real, vivo. Possível.

Não consigo o encarar. Não consigo falar.

Ele percebe. Olha o relógio. Levante-se. Não consigo me mover. Cabeça olhando um ponto  invisível no chão. Consigo notar que ele se vai. Em direção a porta ele caminha. Com a mesma classe que entrou, ele sai. Ao parar na porta de costas para mim, apenas diz:

- É necessário precisão cirúrgica para lidar com a felicidade.

Bate a porta. Não me olha. Fico sentado. Absrorto em meus pensamentos. Eu nem fiz a pergunta, mas tenho a resposta.

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