sábado, 7 de junho de 2014

Anasthasia

Trecho original do livro "Naquela Noite Caminhei Entre Tubos e Copos"


Perambulando em busca de uma dose selvagem conheci Anasthasia, que nada tinha a ver com a princesa russa, pelo que entendi o pai dela era anestesista e tinha alguma relação intima – o que me fez já refletir bastante em conversas com Deus – com a eutanásia, era algum tipo de ativista pró eutanásia e em homenagem as suas crenças deu o nome de Anasthasia pensando nisso, é uma história louca que envolve drogas e desejo de morte – fatores suficientes para eu não querer me aprofundar neste tipo de assunto, então não perguntei mais nada a respeito – mas não tive como fugir, pois como acontece na magia cósmica da poeira estrelar que deu origem aos nossos corpos, nomes, razão e emoção e anseios e medos, Anasthasia tinha impulsos suicidas, gostava de se machucar, gostava de pensar em dor, gostava de sentir dor, confessou que nunca pensou em se matar, “mas eu anseio pelo dia da minha morte”, confessava. No resto dos dias fazia sexo ou usava drogas para sublimar este seu desejo mortal; como morava fora da cidade sempre tinha de terminar suas noites cedo - coisa que nunca acontecia - então terminava mais uma vez chapada na cama de mais alguma boa alma que lhe abrigava em troca de sexo - Ela não tinha saída, era a melhor forma de continuar se matando com prazer – Anasthasia era linda, nos seus olhos gateados eu via a força das mulheres decididas e a loucura das mulheres livres e indomáveis, eu me via encantando pela loucura e excitado pelo resto – buscava dentro de goles a resposta para esta vida desgarrada – mas há coisas nessa vida que é melhor permanecer na ignorância. O livre arbítrio de não querer saber das coisas, de não querer o conhecimento mundano e terreno que jamais me levará à iluminação, que não me colocara do lado de Deus quando tudo isto acabar, que jamais irá acalentar meu coração, para quê querer saber de tanto, se às vezes tanto só aumenta o meu vazio. Entre copos e cigarros e risadas e sacanagens de bar eu me via envolto naquele véu suicida, uma frieza diante da vida que faria mais jus se fosse russa. Pensava nela e pensava no amor e eu tinha certeza que não estava nela, mas também não sei onde estava e me pergunto: "eu quero saber onde está?". A vida corre em um sumo espesso por entre minhas veias, sinto tudo mais nebuloso, mas não sei se quero saber do amor, apesar de morrer de medo todos os dias da minha vida em perder o meu. E ali está ela, acendendo mais um cigarro, enquanto ri e grita com as amigas eu já estou cambaleando de bêbado, entregue a crença que nos rege pensando em como vou fazer se tiver que ficar com ela – "o que vou fazer?" – mais uma dose, por favor.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

Artesão (2006)

Texto/Letra de 2006. Achado na gaveta de meias da memória.

- Feito de barro
por dentro sou oco.
Fui posto de lado
ao esticar de um braço.

Sem ao menos saber que você estava ali.

- Chega de moleza,
a senhora já chegou.
Vamos até a freguesa
pois ela está com pressa.

E pegue a parte que te fala.

- Ai que tu te enganas,
com ou sem eu sou eu.
Apenas demoro para entender o que fazer.

- Deixe de frescura,
você sem ela não é nada,
tampa sem panela, vice versa,
não tem utilidade.

- Pode me levar,
eu garanto o sucesso.
É pra mim e para ela, 
essa promessa que faço.

- Vou confiar em você,
mas não quero queixa.
Faça bem o seu papel e durará muitos anos.

(E seu eu não quiser durar)


domingo, 1 de junho de 2014

Trecho Original

Excerto do texto original de "Naquela Noite Caminhei entre Tubos e Copos".

Lembro que por volta das 16 horas daquele dia tinha resolvido previamente meus assuntos, e então seguia para mais uma caminhada contemplativa. Esportes me levam para outro plano sem jamais deixar de viver e perceber as coisas ao meu redor; caminhadas contemplativas me tiram momentaneamente dessa vida terrena, não percebo mais o mundo ao meu redor e nem consigo fazer a diferenciação de mim e o todo, sou o caminho quando caminho. Mas quando recebi uma ligação de um camarada, abandonei os planos por completo e decidi que tomar uma cerveja para relaxar - se é que mereço tal relaxamento - e aproveitar a vida de desempregado. Entre alguns vários litros de cerveja refleti que se não recordar e registrar estes momentos, jamais em minha vida ou na vida de meus conhecidos, a vida será lembrada. Tanta tecnologia, inventos, alegria, gadgets, 3g, 4g, pontos G, nada disso será lembrado pela fugaz e rasa experiência que é se viver nos dias atuais - onde HD's queimados comem a memória desta geração. Apesar de tantas social medias discutidos em mesas de bar, repletos de publicitários revolucionários, nada disso realmente será lembrado, nada será uma marca ou quiçá um marco. Tantas revoluções em um mundo onde tudo é recriado e nada é novo ou se é, já nasce com data para morrer, contrariando a própria lei da suspensão do fim da vida. Em meio a discussões filosóficas e teóricas sobre isso - que eu já nem queria fazer parte - me fazia de burro para não discutir assuntos infinitos. Não ligo de parecer burro. Prefiro me manter calado a entrar em discussões sobre sexo dos anjos, odeio discutir por apenas discutir, sem jamais ter alguma conclusão. - Naquele momento queria apenas queimar.
E quando não mais esperava por nada que realmente fosse me confortar, com mensagens de orgulho e bobagens de todos os lados, enfim conheci algumas pessoas que pensam, e talvez elas nem me acrescentem em nada, mas temos gostos semelhantes, gostos que se completam, pessoas que me recebem de maneira nova e sincera, pessoas que fazem de mim um ser novo e completo, mesmo que por algumas horas de bebedeira. Saúde.